PROMOÇÃO DE SEGURANÇA E COMBATE À VIOLÊNCIA HOMOFÓBICA/LESBOFÓBICA.

domingo, 31 de julho de 2011

Reportagem Especial

A violência, os números, as pesquisas e os discursos da mudança

Para entender porque que Vitória é a capital mais homofobica do país segundo dados UNESCO, Rafael Ribeiro conversou com policiais, educadores e vitimas do preconceito.

A thing is not necessarily true because a man dies for it.
The Portrait of Mr. W. H. (1889)
Oscar Wilde, escritor homossexual irlandês do seculo19

Em tradução livre: uma verdade não é necessariamente real porque um homem morre por ela.

... Em um fim de semana...
Grande Vitoria - ES

Tinha tudo para ser uma grande festa. Afinal, seria comemorado o 21º aniversario de Emanuel. Ele, o namorado e a prima passaram o dia no shopping escolhendo roupas para a tão sonhada noite. Também foram ao salão de beleza para ficarem mais belos. Não se completa 21 anos todo dia e aquele era especial, pois o namorado a noite estaria pedindo Emanuel para ir morar com ele no recém comprado apartamento na Grande Vitória. A data definitivamente era para ser celebrada. Mas, a noite terminou de forma dramática no hospital.

Foram três caras que começaram a confusão ainda dentro do ônibus. E quando eles perceberam que nós desceríamos na Praia de Camburi, eles nos acompanharam até o posto perto da boite. Dali em diante foi uma loucura. Eles levaram nossos celulares, dinheiro, bateram no Emanuel enquanto seguravam o namorado e eu fiquei paralisada, gritando para os pedestres que se dirigiam ao mesmo local por ajuda. Ninguém fez nada. Quando muito depois, o Emanuel já no chão, desmaiado, passou uma viatura e fomos ao hospital. A festa já era.

Emanuel e seus colegas entraram para a estatística da violência; foram mais uma das vitimas da violência de uma cidade em plena transformação social e econômica. Não fosse um detalhe. Emanuel estava alegre e seus trejeitos não deixaram duvidas que ele seja um homossexual assumido e resolvido. Eles viram em Emanuel a chance de praticar o preconceito que eles carregam consigo pelo diferente e do que eles acreditam estar certo ou errado, afirma Shirley. Foi sim preconceito puro e velado.

Para o taxista que trabalha próximo ao ponto de onde a confusão se armou e confessou ter visto tudo de dentro de seu carro isso não é novidade. Sabe camarada, infelizmente é comum ter sempre aqui um grupo ou outro para praticar o mal e a violência na área tem aumentado afirma ele.

Na Delegacia de Crimes e Proteção a Vida de Vitória, um funcionário que não quis se identificar, disse que esse tipo de denuncia não costuma aparecer por la. Em dois anos, nunca presenciei nada do gênero. Agora, marido que bate em mulher, toda hora tem, completa. Ele acredita que os LGBTS preferem ficar no anonimato para não sofrerem represálias, mas aconselha que, é necessário que vocês denunciem para que essa prática que é passível de crime e cadeia acabe.


Os números da violência no Estado e o chocante novo relatório nacional
Dados da policia militar registram que somente no período de 01 de janeiro de 2010 até 15 de outubro de 2010, foram 658 homicídios por arma de fogo; 60 homicídios por arma branca (arma branca: faca, estilete, inchada, facão, etc). E a triste confirmação: NENHUMA ocorrência de preconceito.

As ocorrências são somente do estado do Espírito Santo. Ele ainda lembra que este número pode ser maior pois, algumas cidades do interior ainda não estão informatizadas.

Mas segundo dados do Grupo Gay da Bahia (GGB), a historia é outra para os capixabas. Detalhe: “No Espírito Santo tivemos registro de 5 homicídios sendo 2 gays e 3 lésbicas. Querer que a homofobia, seja qualificada crime não deveria ser apenas um anseio dos gays, mas de todos. Nós queremos mais, inclusive delegacias especializadas em Crimes Homofóbicos\\\".

Ao finalizarmos nossa reportagem, recebemos a denuncia de 2 travestis mortos no período do natal em bairros do município de Serra na Região Metropolitana da capital capixaba. Um inclusive, queimado. Na delegacia, os funcionários conheciam as agressões, mas desconheciam o fato que eles foram motivados por homofobia.

Nacionalmente, os dados que foram divulgados no dia 17 de outubro de 2010 mostram um cenário sinistro e preocupante para a comunidade LGBTS. Em 2009, 198 foram mortos no Brasil. Onze a mais que em 2008, e 76 a mais do que em 2007, um aumento de 62%. Segundo a pesquisa, de 1980 a 2009 foram documentados 3.196 homicídios, média de 110 por ano.

Na divulgação dos dados, Marcelo Cerqueira, presidente do GGB comenta que Infelizmente, a homofobia é um aspecto cultural da sociedade brasileira, que empurra os homossexuais para a clandestinidade, fazendo com que permaneçam à margem mesmo quando são mortos. Gays, lésbicas e travestis são mortos de forma cruel, geralmente tendo o rosto desfigurado, e acabam sendo considerados culpados. Só os crimes muito hediondos comovem.

A entidade alertou que apesar das políticas do Governo destinadas ao combate à homofobia, o número de assassinatos de homossexuais vem crescendo, sendo que há crueldade na maior parte dos casos. Vide o caso do travesti que teve o pescoço esfaqueado.

Numa pesquisa rápida feita junto ao Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos, percebeu-se que nas paradas do Orgulho Gay de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Porto Alegre e Belém entre 2003 e 2008, 59% dos participantes declararam terem sido vítimas de algum tipo de agressão física ou de discriminação.

Em Cariacica/ES, uma pessoa foi manchete local ao ser baleada na cabeça numa parada Gay. Mas segundo dados oficiais, o individuo não tinha nada a ver com a parada gay, pois ele não era gay. Somente estava na hora errada no lugar errado. (?)

Mudança na base
Mas como mudar uma sociedade se nem os educadores sabem como reconhecer o que acontece dentro de suas salas de aula? Enfática, a mãe de Emanuel afirma que seu filho ainda foi motivo de muita piada dentro da escola.

O discurso dessa mãe está alinhado a pesquisa realizada em parceria entre a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cidadania (Unesco) e o Ministério da Educação (MEC) que, demonstrou que uma parcela significativa de professores e alunos de Vitória têm dificuldades em aceitar alunos e colegas de escola homossexuais.

Um dia, o Emanuel chegou com os lábios machucados. Fiquei desesperada. Fui à escola falar com a coordenadora do turno que na maior cara de pau, afirmou que se o menino se comportasse como homem não sofreria dessa forma. Ela ainda deu o entender que a culpa seria minha. Fiquei indignada e abri um processo, que corre em segredo, na SEDU contra ela.

Se a mãe de Emanuel fez uma denuncia formal, o que explica o fato de que não há registros de ocorrências feitas pelos estudantes homossexuais na Secretaria de Educação Capixaba. Às vezes penso que não existimos, afirma uma lésbica do departamento – cansei de ver e ouvir piadas politicamente incorretas aqui dentro, mas tenho que trabalhar e pagar as contas, então, finjo que não ouço nem vejo nada. Para os educadores a teoria é sempre melhor que a prática.

Esses dados se refletem em pesquisas. Em uma delas, realizada com jovens estudantes e professores da Capital e apontou que em Vitória 47,9% dos professores declaram não saber como abordar os temas relativos à homossexualidade em sala de aula. Além disso, 44% dos estudantes do sexo masculino de Vitória não gostariam de ter colegas de classe homossexuais.
Uma segunda coordenadora do ensino médio em Vitória, afirma que não julga o fato dos adolescentes estarem cada vez mais abertos quanto a sua sexualidade, porém ela entende que nos dias de hoje, onde religião (???) está tão importante quanto ao poder econômico fica difícil fazer com que todos os diferentes em credos, gêneros, cores e afins co-habitem o espaço escolar de forma harmônica. Para ela, a tecnologia está contribuindo para que os jovens de hoje cresçam mais intolerantes justamente pela rapidez tecnológica imposta a sociedade contemporânea.

Questionada se a coordenadora sabe reconhecer o bullying ela afirma que a SEDU está oferecendo novos cursos para que os profissionais envolvidos se capacitem e possam auxiliar no melhor entrosamento dos alunos dentro e fora da sala de aula. O processo está apenas começando. Desde 2005 o MEC veem trabalhando em várias ações contra esse tipo de preconceito, dentro do programa BRASIL SEM HOMOFOBIA. As principais estratégias são produzir material didático específico e formar professores para trabalhar com a temática. E em 2011, o congresso discute o programa ESCOLA SEM HOMOFOBIA. O ano promete.

Nacionalmente o governo parece jogar nosso dinheiro de contribuinte na lixeira apesar de estar se mobilizando. Isso porque nas escolas públicas brasileiras, 87% da comunidade – sejam alunos, pais, professores ou servidores – têm algum grau de preconceito contra homossexuais. O dado faz parte de pesquisa divulgada recentemente pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP) e revela um problema que estudantes e educadores homossexuais, bissexuais e travestis enfrentam diariamente nas escolas: o crescimento da homofobia. O levantamento foi realizado com base em entrevistas feitas com 18,5 mil alunos, pais, professores, diretores e funcionários, de 501 unidades de ensino de todo o país.

A violência dura, relacionada às armas, gangues e brigas, é visível. Já o preconceito a escola tem muita dificuldade de perceber porque não existe diálogo. Isso é empurrado para debaixo do tapete, imperando a lei do silêncio, destaca a socióloga e especialista em educação e violência, Joanna Kátia, que também é consultora no assunto.

No meio disso tudo, o que tem sido feito para se aplacar esse dilema? Como nós podemos nos defender dessa crescente onda de violência? Há uma lei em tramitação no plenário federal. Mas será que ela pega? A capital mais homofobica do país, parece estar mudando de discurso ou mascarando os reais problemas?

Mudança de atitude?
Contrariando dados da UNESCO que declara Vitoria a capital mais homofobica da Republica, o professor, pesquisador e mestre em Educação Elias Mugrabi ministrou outra pesquisa, exclusivamente com alunos e professores da rede municipal de ensino de Vitória e encontrou dados que mostram mudança no perfil de alunos e docentes. As impressões do professor foram dadas em entrevista à rádio CBN. Enquanto a pesquisa da Unesco aponta Vitória como a capital mais homofóbica do País, a do professor Elias Mugrabi constatou que 77% dos entrevistados na rede municipal aceitariam colegas homossexuais.

Na pesquisa 76,7% dos alunos que responderam ao questionário aceitariam ter como colega de classe um aluno homossexual. O professor ainda constatou que 71% dos estudantes aceitariam fazer trabalhos escolares com um colega homossexual.

Contestando dados da UNESCO, 80% dos estudantes afirmam que os homossexuais deveriam contar com algum dispositivo na lei que os protejam. Ao mesmo tempo, 40% identificam que colegas são discriminados por serem homoafetivos dentro das escolas. Essa contradição reflete o despreparo por parte da escola ao tema. Reflete também o fato de não estarmos na mesma sintonia de discurso, o que acaba nos deixando nas mãos de aproveitadores políticos que, por um instante se enrolam na bandeira do arco-iris e depois, nunca ouvimos falar deles novamente. 
Ouça na integra a entrevista do Mestre a CBN Vitoria.

Vitoria, 14.30, 03 de janeiro de 2011


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